O modo de vida dos portugueses foi – e muito – moldado pela pandemia da Covid-19. Os confinamentos mostraram a importância de viver em casas com áreas maiores e com espaços ao ar livre. E o teletrabalho, que se massificou em 2020, criou a possibilidade de trabalhar à distância. Tudo isto acabou por criar uma tendência em Portugal: viver no campo, em contacto com a natureza e longe dos grandes centros urbanos. Até porque aqui as casas para comprar tendem a ser mais baratas. Mas será que esta tendência veio para ficar? Ao que tudo indica, sim (e até está reforçada): os dados do idealista/data revelam que a procura de casas à venda disparou em 81% dos concelhos com menos de 10 mil habitantes entre o início de 2020 e o arranque de 2024. E contam-se mesmo 48 municípios menos populosos do interior e ilhas onde o interesse em adquirir casa mais que duplicou neste período.
Procura de casas à venda no interior sai reforçada 4 anos depois do início da pandemia
Foi em março de 2020 que a Organização Mundial da Saúde declarou a presença da pandemia da Covid-19. Seguiram-se múltiplos confinamentos em Portugal, várias empresas com trabalhadores em layoff e outras a permitir que os profissionais exercessem funções em teletrabalho. O pedido nacional resumia-se em “Ficar em Casa”, a solução mais eficaz para evitar a transmissão do vírus SARS-CoV-2.
O tempo passado em casa multiplicou-se. E as famílias começaram a sentir falta de ter mais divisões em casa, como um escritório para teletrabalhar, por exemplo. De ter habitações com áreas de convívio maiores, mais espaços ao ar livre, como varandas, jardins ou terraços. Estas necessidades acabaram por moldar a procura de casas em Portugal, quer em termos de características da habitação (divisões, áreas e espaços exteriores), como também em termos de localização.
A massificação do teletrabalho durante a pandemia – e o facto de se tornar num novo modo de trabalho no longo prazo, conjugado até com idas ao escritório (trabalho híbrido)– abriu o leque de possibilidades às famílias que decidiram mudar de casanesse período, já que passaram a considerar territórios longe dos centros urbanos, como Lisboa ou o Porto, onde comprar casa é mais caro. Os dados do idealista/datarevelam que a procura de casas à venda aumentou em 66 dos 120 concelhos com menos de 10 mil habitantes com dados disponíveis (de um universo de 122) entre o início de 2020 e o arranque de 2021. E houve mesmo 25 concelhos menos populosos onde o interesse das famílias aumentou 75% ou mais.
Foi em Mêda, distrito da Guarda, e em Belmonte, distrito de Castelo Branco, onde a procura de casas para comprar mais subiu entre esses dois momentos, tendo mesmo quadruplicado. Nos municípios de Redondo, Vidigueira, Penela, Alvito, Vila Velha de Ródão e Ponta do Sol o interesse em adquirir habitação também mais que duplicou durante o primeiro ano da pandemia. Esta evolução colocou mesmo Mêda como o município com menos de 10 mil habitantes mais procurado para comprar casa no início de 2021.
25 municípios onde a procura de casas à venda disparou no 1.º ano da pandemia
Isto quer dizer que o interesse em viver no campo, rodeado de natureza e no sossegodo interior do país disparou no primeiro ano da pandemia da Covid-19. Mas será que esta tendência na procura de casas veio para ficar? Quatro anos depois, esta moda de viver no campo parece ter saído reforçada, já que a procura de casas à venda disparou em 97 dos 120 concelhos com menos de 10 mil habitantes entre o início de 2020 e o arranque de 2024. E em 48 concelhos o interesse em comprar casa fora das grandes cidades mais que duplicou: foi o caso de Nisa, Santa Cruz das Flores, Porto Moniz, Vila do Bispo, Vila Velha de Ródão, Vila Nova de Poiares, Góis e Vila Nova de Paiva.
Em resultado desta evolução, o município de Santa Cruz das Flores, nos Açores, tornou-se no mais procurado de todos para comprar casa entre os concelhos menos populosos do país. Logo a seguir está Porto Moniz, Povoação, Nisa, Lajes das Flores e Nordeste. Em todos eles a procura de casas mais que duplicou em quatro anos.
Também salta à vista que 11 dos 25 municípios mais procurados para adquirir habitação em 2021 continuam a sê-lo no início de 2024, revela o idealista/data. São eles: Lajes das Flores, Viana do Alentejo, Redondo, Ferreira do Alentejo, Monchique, Alcoutim, Lajes do Pico, Arraiolos, Aljezur, Alandroal e Cuba.
Como variou a oferta de casas nos municípios menos populosos do país no pós-covid?
A tendência de viver no campo poderá ter estimulado a colocação de mais casas nomercado de compra e venda no interior do país. É isso que sugerem os dados do idealista/data: no primeiro ano da pandemia (entre março de 2020 e março de 2021) registou-se um aumento da oferta de habitação em metade dos municípios menos populosos, com os maiores aumentos a serem sentidos em Melgaço (Viana do Castelo) e Vimioso (Bragança), onde o stock duplicou.
Se olharmos para o balanço do antes e depois da Covid-19 (início de 2020 e início de 2024), observa-se que houve um aumento de casas para comprar em 86 municípios pouco populosos do interior do país e ilhas – ou seja, mais 25 territórios que no primeiro ano de confinamentos.
Uma vez mais, foi em Melgaço e em Vimioso onde os aumentos de stock foram mais expressivos em quatro anos. Ainda assim, estes dois concelhos estão entre os menos procurados para adquirir uma habitação no início de 2024. Porquê? Por um lado, aprocura de casa está mais distribuída pelo maior número de casas existentes, resultando num menor número de contactos por anúncio. E, por outro, as casas à venda podem não ter as características que as famílias procuram, levando a que haja menos demonstrações de interesse.
Afinal, o elevado interesse pelas famílias em morar no interior pode ter dois efeitos sobre a oferta de habitação existente, o que pode explicar as variações registadas nos 25 municípios mais procurados para viver no campo no início de 2024:
- Maior venda de casas: o que ajuda a justificar a queda de stock em 13 destes 25 concelhos, com Cuba (-50%) e Vila Nova da Barquinha (-33%) a liderar as descidas;
- Estimular a colocação de mais casas no mercado, uma vez que há mais interessados e mais oportunidades de fazer negócio. Esta pode ser a justificação para o facto de haver um aumento da oferta de casas à venda nos outros 12 concelhos que despertaram mais interesse a quem quer mudar de casa nos primeiros três meses de 2024. Em Lajes do Pico, Carregal do Sal e Mesão Frio o número de habitações para comprar mais que duplicou entre os primeiros trimestres de 2020 e 2024.
Texto Idealista. Ver análise completa aqui: https://www.idealista.pt/news/imobiliario/habitacao/2024/05/16/63793-viver-no-campo-a-moda-da-pandemia-virou-tendencia-no-pos-covid