O caminho para a paz na Ucrânia promete ser longo e muito difícil, receando-se que Trump e os Estados Unidos deixem de mediar este processo. Por isso, os europeus devem estar prontos para tudo.
O nível das conversações de hoje em Londres desceu de ministros dos Negócios Estrangeiros para conselheiros dos mesmos. Marc Rubio, secretário de Estado norte-americano, decidiu, à última hora, não viajar para a capital britânica, decisão que levou os chefes da diplomacia alemã e francesa a reagir de igual forma.
Era previsível que Steve Witkoff, enviado especial de Trump para as conversações sobre a paz na Ucrânia, voasse, depois desse encontro, para Moscovo com vista a entregar a proposta norte-americana, ucraniana e europeia a Vladimir Putin.
Segundo alguns observadores, essa proposta contém cinco pontos: 1) A Crimeia é reconhecida oficialmente como parte da Federação da Rússia; 2) Reconhecimento de facto dos territórios ocupados pela Rússia; 3) Compromisso de a Ucrânia não aderir à NATO; 4) Levantamento das sanções contra a Rússia; 5) Reforço da cooperação económica com os Estados Unidos.
Como contrapartida, Kiev receberia garantias de segurança, mas não dos Estados Unidos: os países europeus teriam o papel central neste processo.
Alguns analistas consideraram que Marc Rubio não foi a Londres pelo facto do presidente ucraniano, Volodymir Zelensky, se ter recusado a reconhecer a Crimeia como parte da Rússia, mas o plano norte-americano apenas prevê esse reconhecimento pelos Estados Unidos.
A mudança de planos do chefe da diplomacia norte-americana pode dever-se ao facto de Zelensky ter afirmado que a delegação ucraniana em Londres apenas iria ter mandato para a assinatura de um acordo sobre o cessar-fogo.
Paralelamente, observamos um autêntico “jogo de ping-pong” entre Putin e Zelensky no que respeita às conversações de paz. O dirigente russo propõe um cessar-fogo pascal de 30 horas, não cumprido por nenhuma das partes, e Zelensky respondeu com a proposta de um cessar-fogo de 30 dias. Putin propõe conversações bilaterais sobre a paz, Zelensky responde defendendo que primeiramente se deve assinar um acordo de cessar-fogo e só depois dar início às conversações de paz.
Também ainda não há acordo sobre os territórios ocupados pelas tropas russas no Leste da Ucrânia. Alguns órgãos de informação ocidentais noticiaram que Vladimir Putin estaria disposto a aceitar a frente de combate como linha de separação entre os litigantes, mas o Kremlin apressou-se a considerar isso uma “falsa notícia” e deixa claro que continua a apostar na anexação das quatro regiões do Leste da Ucrânia.
Trump tem pressa para travar o conflito na Ucrânia e ameaça abandonar as conversações se as partes do conflito não chegarem a um acordo, mas é o próprio Kremlin que sublinhar que o processo de paz irá ser longo.
Se a administração de Trump realmente abandonar as conversações, será a Europa a arcar com as responsabilidades. Serão os líderes europeus capazes?
P.S. Na hora da despedida do Papa Francisco, é preciso sublinhar não só os êxitos, mas também as insuficiências na sua atividade internacional. Aqui é de salientar que o chefe da Igreja Católica não quis optar por uma posição clara face à invasão da Ucrânia pelas hordas russas, ele nunca acusou diretamente a Rússia de ser a agressora, tentando manter-se “neutro”.
O Sumo Pontífice não foi a Kiev, nem à Ucrânia manifestar o seu apoio aos milhões de católicos e uniatas (cristãos que reconhecem a supremacia do Papa, mas seguem o rito ortodoxo oriental). A justificação foi que ele só faria essa viagem a Kiev se também tivesse oportunidade de visitar Moscovo, mas é pouco convincente, pois, como é sabido, a Igreja Ortodoxa Russa, não obstante todos os elogios a Francisco I na hora da sua morte, não quer ver o Papa no seu “território canónico”.
No dia a seguir à invasão do território ucraniano pelas tropas de Putin, Francisco I foi visitar a representação diplomática russa junto do Vaticano e, segundo a agência noticiosa oficial RIA-Novosti, “mostrou preocupação com o que se passa no Donbass”, sem precisar a violação do Direito Internacional pelo Kremlin. “Uma posição ponderada e não tirou conclusões apressadas”, conclui a citada agência.
José Milhazes, jornalista e historiador