Pouco ou nada se deve esperar da Conferência de Paz para a Ucrânia, que irá ter lugar este fim de semana na Suíça.
Já seria muito bom se a reunião terminasse com a promessa de realização de uma nova conferência com a participação da Rússia, mas as novas propostas de Putin fazem prever um aumento da intensidade dos combates no terreno.
O Presidente ucraniano, Volodomyr Zelensky, desde o início da organização da conferência, tentou apresentar um caderno de propostas para a paz que pudesse ser aceite pela maioria dos chamados “países do Sul”. O programa de dez pontos apresentado por Kiev como base para o início de conversações de paz com a Rússia foi reduzido a três pontos. Zelensky, por exemplo, deixou cair a exigência da retirada das tropas russas de todos os territórios da Ucrânia, incluindo a Crimeia, e ficaram apenas “a segurança nuclear”, “a segurança alimentar” e “a troca de prisioneiros”.
Mas isso não convenceu países importantes como a China e o Brasil a estarem presentes na conferência, alegadamente pelo facto de a Rússia, enquanto parte do conflito, não ter sido convidada. Aliás, esses dois países, paralelamente à Rússia, começaram a realizar um trabalho com vista a convencer outros membros da comunidade a não comparecerem na Suíça.
Caso a cimeira falhe, a China poderá congratular-se com esse êxito, pois isso abre-lhe a possibilidade de convocar uma nova conferência com a participação da Rússia, ou mesmo de Vladimir Putin. Pequim surgirá como o mensageiro da paz e de uma nova ordem internacional mais justa.
Para tentar dar um “golpe de misericórdia” na cimeira e agudizar ainda mais a tensa situação, Vladimir Putin, num encontro com os diplomatas russos, veio precisar a sua “fórmula” capaz de pôr fim imediato à guerra. Segundo o ditador russo, a Ucrânia renuncia definitivamente a juntar-se à Aliança Atlântica e reconhece como territórios russos as regiões da Crimeia, Donetsk, Luhansk, Kharkyv e Zaporíjia. Se, semanas antes, Putin falava apenas em “congelar” o conflito pela linha da frente existente entre as tropas ucranianas e russas (a que chamava “novas realidades”), agora vem alargar as suas pretensões.
É evidente que semelhante posição não pode ser aceite, nem como base de discussão, pela Ucrânia, pois isso significaria uma humilhação com consequências trágicas. Vladimir Putin quer receber de mão beijada aquilo que as suas hordas militares não conseguiram conquistar durante mais de dois anos de guerra!
Se Zelensky pensasse apenas em ajoelhar-se perante Putin, ele seria amaldiçoado eternamente pelo seu, pois os ucranianos têm consciência de que, depois, o ditador russo irá enveredar pela conquista completa da Ucrânia e pela instalação de um poder pró-russo fantoche.
Com este último ultimato alargado de Putin, as decisões da Conferência de Paz não terão grande utilidade e serão recebidas como mais uma “acção dos países ocidentais” contra a Rússia.
Na mesma conversa com diplomatas russos, Putin falou da necessidade de criação de novas ordens regionais e mundiais multipolares e abertas. Diríamos que se trata do cúmulo do cinismo. O discurso de Putin é prova disso.
José Milhazes, jornalista e historiador